Lei que prevê a universalização do saneamento básico completa dois anos sem grandes avanços

Por Rebeca Mota | 29/03/2022

O Marco legal do saneamento é uma lei, que traz uma série de questões a respeito da regulamentação do saneamento básico no Brasil. E diz, de modo geral, como o fornecimento, a distribuição, a coleta e o tratamento de esgoto e de águas pluviais devem ser realizados em todo o território nacional. Além disso, a lei aponta diretrizes para a coleta regular e o tratamento do lixo, tendo como objetivo final a preservação do solo e a garantia de água potável para todos.

Prestes a completar dois anos, a lei criada em Julho de 2020 não garantiu grandes avanços no setor, como aponta a pesquisa realizada pelo Instituto Trata Brasil, divulgada no dia 22 de março: a ausência de acesso à água tratada atinge quase 35 milhões de pessoas e 100 milhões de brasileiros não têm acesso à coleta de esgoto, refletindo em centenas de pessoas hospitalizadas por doenças de veiculação hídrica.

Os dados do sistema nacional de informações sobre saneamento (SNIS) apontam que o país ainda tem uma dificuldade com o tratamento do esgoto, do qual somente 50% do volume gerado são tratados – isto é, mais de 5,3 mil piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento são despejadas na natureza diariamente.

O especialista em infraestrutura e logística social, Paulo César Alves de Rocha, aponta como barreira para as garantias, a falta de sintonia entre os agentes envolvidos e uma legislação que dê segurança jurídica nas questões ligadas ao uso da água. Apesar da data festiva, segundo ele, há pouco o que se comemorar.

O SNIS, apontou em pesquisa realizada em 2020, que 97 milhões de pessoas não tinham coleta de esgoto residencial no país. O levantamento mostra ainda que no mesmo ano foi investido um total de mais de 6 bilhões de reais em manutenção de toda a rede de sistemas de água.

Paulo César chama a atenção também para o cuidado com os rios e nascentes, principalmente aqueles localizados nas metrópoles, com chance maior de poluição. “Os rios devem manter uma vazão que atenda a todos e em convivência harmônica: população ribeirinha para água potável e possibilidade de exploração de pesca de sobrevivência, meios de transporte autorizados e estabelecidos; água para irrigação da agricultura e para as indústrias; água para eventuais projetos de abastecimento de grandes cidades e geração de energia elétrica. Este cenário ideal está cada vez em maior desequilíbrio”, afirma e denuncia que além desses fatores de maior notoriedade, existe a carência de informação para a sociedade de modo geral com relação ao uso do recurso hídrico.

São Paulo, por exemplo, é uma cidade construída sobre mais de 300 rios. E, segundo informações do site da Sabesp, a rede de abastecimento possui 75,3 mil quilômetros de extensão. Mesmo assim, o curso da água não é democrático: um levantamento realizado pela bancada ativista em 2020 mostra que São Paulo tem 70 pontos com falta total ou parcial de água - 80% desses pontos são em bairros periféricos, e essa porcentagem pode aumentar caso os governos estaduais e municipais não estabeleçam, normas que garantam na prática a universalização desse direito.

“Isso quer dizer que os municípios precisam estar atentos às demandas apresentadas bairro a bairro; já as prestadoras de serviço, como a SABESP, em São Paulo, precisam estar atentas às necessidades de infraestrutura dos territórios que recebem o fornecimento do serviço prestado. A população, por sua vez, se munir de informações que conscientize sobre a preservação e economia da água que é consumida todos os dias, bem como o descarte correto do lixo produzido”, defende.
Com a celebração do dia mundial da água o especialista reitera algumas recomendações para os poderes:

? Deve-se penalizar quem joga lixo na rua e quem tem imóveis que possuem rede de esgotos sanitários disponíveis para ligação, mas que lançam seus esgotos nas redes de águas pluviais.

? É preciso estabelecer regulamentação do acesso à água subterrânea, de maneira a enfrentar tanto a exploração desenfreada que pode comprometer as reservas existentes, quanto dar segurança jurídica aos investimentos feitos com boa-fé.

? Fomentar a existência de incentivos fiscais para a micro e mini geração própria de energia elétrica.

? Estabelecer a existência de incentivos fiscais para o reuso de água tanto em residências como na indústria e comércio.

? Promover a recuperação das nascentes dos rios, com incentivo a projetos de recuperação dos olhos d’água, como explicado pelo Sebastião Salgado.

Outro fator preocupante que o especialista faz questão de enfatizar é a crise hídrica. Nos últimos dois anos o Brasil enfrentou um clima extremamente seco - o fato impulsionou rodízios de abastecimento em diversas regiões do Brasil e da grande São Paulo. A Questão acende um alerta para todos, pois água é matéria-prima necessária à vida no planeta.
Paulo César finaliza apontando para a gravidade das ações isoladas, uma vez que a rede de águas pluviais estão interligadas e chegam de uma ponta à outra do país. “Apesar da abundância de água salgada, a água doce (potável) está acabando em todo o mundo. É preciso cobrar autoridade e ter em mente que quando você joga lixo em lugar inadequado, você polui a água de outras pessoas, e tira de alguém um direito que é universal: o de ter água limpa e de fácil acesso em todas as casas”, conclui.

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