Projeto literário concretiza sonhos em escola da periferia de Taboão da Serra

Por Prefeitura Municipal de Taboão da Serra | 13/12/2019

Conectar uma comunidade através da educação é a idealização daqueles que acreditam no seu poder transformador dentro de qualquer sociedade. A participação e engajamento de um núcleo de pessoas em um trabalho que a destaque e a expanda é o que, por vezes, move quem acredita na sua capacidade de concretizar sonhos. E foi partindo desse princípio que a professora Rose Mattos da EMEB Darcy Ribeiro, no Jardim São Judas Tadeu, trouxe para a escola o Projeto Estante Mágica. 

Rose, que dá aulas para alunos do Atendimento Educacional Especializado (AEE), conheceu o projeto quando teve a chance de participar da Bett Educar em maio. Maior evento de educação e tecnologia da América Latina, a Bett Educar reúne profissionais da área de todo o país, além de promover debates e palestras sobre o que há de mais moderno no segmento. 

Foi andando pelos stands que apresentavam novas propostas e projetos para o ensino, que Rose se encantou pelo Estante Mágica. “Aquilo me chamou a atenção, principalmente porque eu tenho um aluno autista que já tinha escrito um livro e sempre sonhei em publicá-lo. Quando me deparei com a possibilidade disso se tornar real, me empolguei e quis levar a proposta para a coordenadora e diretora da escola”, conta. 

A professora, motivada pelo anseio de transformar a história escrita pelo seu aluno Régis Samuel Sousa em livro, não imaginava à proporção que aquilo tomaria na escola. “Conversei com a minha coordenadora sobre o projeto e depois com a diretora. As duas amaram. Era difícil porque é por adesão. Então é um projeto novo que entra no meio do ano e necessita de um número mínimo de alunos. Cem alunos precisavam participar. Achei que seria complicado em um primeiro momento, mas me surpreendi. A adesão foi além do que necessitávamos e imaginávamos”, diz. 

 

O projeto na EMEB Darcy Ribeiro

O Projeto Estante Mágica incentiva os alunos a usarem a criatividade, escreverem e lerem. Os professores acompanham todas as etapas que vão da escolha do tema até a publicação. No caso da EMEB Darcy Ribeiro, localizada no Jardim São Judas, o tema foi livre. O intuito foi justamente deixar a imaginação dos pequenos voar e estimular as habilidades de cada um deles. 

O fato das obras terem sido desenvolvidas em salas de aula trouxe uma surpresa. A diretora Luciana Rosa conta que os pequenos não queriam faltar e o número de frequência aumentou em 30%. “A questão da evasão diminuiu bastante. Os alunos tinham que vir porque a produção do livro foi realizada em um tempo curto. Então os alunos tinham que estar na escola para a produção. As próprias mães descreveram o quanto eles estavam animados e se recusavam a não ir para a escola”, relata. 

Os bons resultados foram nítidos e não pararam por aí. Os pais dos alunos também se envolveram ativamente no processo de criação. Para cada livro uma bibliografia sobre o aluno foi montada. A responsabilidade disso ficou a cargo dos responsáveis e, mais uma vez, um fato inesperado aconteceu. 

Em outros colégios da grande São Paulo onde houve a inclusão do projeto na grade de ensino, cerca de 30% das bibliografias não foram escritas. No caso do Darcy Ribeiro, todas foram realizadas. 

A diretora Luciana conta que isso foi um compromisso selado desde o momento em que houve a adesão do projeto. “Ou a gente vai fazer uma coisa aonde os pais vão ter o compromisso deles, a escola vai ter o compromisso dela e os professores também, ou a gente coloca um ponto final. E para a nossa surpresa, aqui no Darcy Ribeiro, 100% das bibliografias foram feitas. Todos os pais participaram”, fala.  

A escola inteira foi mobilizada para isso. As professoras, mediadores da informática e os funcionários da secretaria ajudaram a trazer esses pais para dentro da escola. Foi feito contato para falar sobre o livro e explicar o projeto. Além disso, outro suporte dado foi o relacionado ao uso da plataforma. Os funcionários ajudaram os pais a criarem contas de e-mail e a fazerem o cadastro no portal do Estante Mágica. 

Entre os momentos de interação entre todo o núcleo, alguns de grande emoção ficarão guardados para sempre na memória. Um deles, segundo a coordenadora Priscila Santos, foi quando o pai de uma aluna, que é cubano, foi escrever a bibliografia da filha. “Ele não fala português e a filha disse que iria traduzir. Ele falou, eu digitei e a filha traduziu o material. Foi muito emocionante. Um exemplo claro de como o projeto envolveu toda a comunidade”, relata. 

O feito desenvolveu não só a questão pedagógica, como também a humana. É justamente isso que enche os olhos da professora Rose de lágrimas. “Toda a comunidade se empenhou. Além disso, pegamos alguns casos de alunos com dificuldade de aprendizado que evoluíram muito no decorrer do projeto. Essa vontade deles de concretizar, não querer faltar na escola para concluir, foi demais. Nossa tarefa como educadores é promover o desenvolvimento das crianças e isso foi uma estratégia que encantou os nossos pequenos. E fomos além ao integrar os pais. Foi uma expansão de dentro para fora. Não imaginava que tomaria essa proporção”, finaliza. 

 

As histórias e inspirações

A EMEB Darcy Ribeiro foi a primeira escola da rede municipal de ensino de Taboão da Serra a aderir o projeto Estante Mágica. Ao todo, 227 livros foram produzidos no formato e-book e desse montante, 149 foram impressos. A escolha de transformar ou não em livro físico ficou a critério dos familiares. 

A criatividade dos alunos rolou solta e muitos temas foram desenvolvidos. Os elementos principais foram imaginação, inovação e encanto. Poesia, contos de fadas e relatos pessoais são algumas das temáticas  que foram escolhidas pelos pequenos. Com liberdade de criação alguns optaram, inclusive, por discutir assuntos que estão em pauta na sociedade. Um desses exemplos é a história de uma das alunas do 5º ano, que acende a necessidade de debater a depressão. 

“Ao primeiro instante, quando peguei pra ler, me assustei. Achei que ela estava passando por algum problema. A chamei para conversar pra entender o que estava acontecendo. E ela me disse que tinha escolhido esse tema porque acha importante falarmos sobre a depressão e saber diferenciá-la da tristeza. É uma aluna de 10 anos com esse discurso. É emocionante”, conta a diretora Luciana. 

O inspirador do projeto, Régis Samuel Sousa do 3º ano, quis manter a mesma história que escreveu no ano passado. O menino que gosta de desenhar e sonha em ser astronauta quando crescer escreveu “A princesa Michelle e os animais diferentes”. O livro explora um universo lúdico cheio de magia e personalidade. 

“O Régis é um dos grandes responsáveis pelo Estante Mágica ter sido aplicado na EMEB Darcy Ribeiro. Foi pensando na história dele que quis saber mais sobre o projeto. É uma realização muito grande ver uma criança autista superando as barreiras e produzindo algo tão grandioso. Ele tem um enorme potencial”, relata a professora Rose. 

Quando questionado sobre a experiência de escrever e ilustrar o próprio livro, o pequeno Régis sorri e diz: “Eu gostei muito de usar a minha criatividade”. E finaliza perguntando aos que estão ao redor se querem ler e ver a sua obra prima. 

Há ainda aqueles que já possuem o gosto e aptidão pela escrita. Esse é o caso da aluna do 5º ano, Danielle Gomes. Sua matéria favorita é português, justamente pela possibilidade de contar histórias. “O meu livro fala sobre uma menina curiosa que dormiu e foi para um lugar de sonhos. E de repente ela acordou e pensou que aquilo poderia ser um sinal”. A imaginação leva a lugares foi o título escolhido pela estudante que com brilho nos olhos e sorriso largo demonstrou o orgulho em produzir a própria obra. 

A noite de autógrafos

Na quarta-feira, 4 de novembro, 149 alunos participaram da tão esperada e sonhada noite de autógrafos que marcou a conclusão do projeto. A emoção tomou conta da EMEB Darcy Ribeiro e de todos os presentes que foram prestigiar o lindo trabalho desenvolvido pelos estudantes do 1º ao 5º ano. 

“A noite de autógrafos foi um momento muito aguardado pelos pais, alunos e professores. É a concretização de um projeto fantástico em que houve o engajamento de toda a comunidade. Ganhamos em satisfação de trabalho, nossos alunos se envolveram ainda mais e os pais participaram ativamente”, relata o secretário de Educação, João Medeiros. 

As professoras entregaram aos pequenos os livros idealizados por eles. No semblante, a feição de surpresa e o ar de satisfação foram unânimes. As crianças, após olharem com os próprios olhos o resultado de todo o trabalho e empenho feitos, presentearam os pais com as obras. Com orgulho latente, os familiares receberam os livros com dedicatória e autógrafo. 

Uma das pessoas mais emocionadas da cerimônia foi a professora Rose Mattos que manteve o brilho no olhar o tempo todo. “É gratificante.  As famílias e nós, educadores, muitas vezes duvidamos do potencial das crianças. E eles têm potencial. Os livros são exemplos disso. Eu debati a história, instruí, ouvi os enredos e auxilie. Mas foram eles que concretizaram aquilo. Quando a gente pega esses livros prontos e vê o capricho, tudo vale a pena”, diz. 

Neia Lopes, também professora da escola, concorda com a colega Rose. ““Eu faria tudo de novo. Eu me apaixonei por esse projeto. Criar cada pedacinho e depois desenhar e ver a evolução dessas crianças é muito bom. Quando eu vi tudo pronto, eu só conseguia chorar”, finaliza.  

A primeira edição foi um sucesso e a proporção que o projeto tomou na escola é a maior prova disso. Ao final das contas, a professora Rose que visitou a Bett Educar em maio não teria noção do que um vago sonho poderia significar para toda uma comunidade que viu na educação a concretização de ideais de transformação.

 

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