Carne continuará mais cara em 2020, dizem especialistas

Por Outro autor | 4/12/2019

Por Fernando Augusto Graça Monteiro Lopes, do Eu Quero Investir 

A carne segue sendo a vilã na mesa dos brasileiros nesse final de 2019. E o preço do produto deve continuar salgado em 2020, segundo especialistas em comércio exterior e inflação consultados pela BBC News Brasil.

São dois os principais culpados por essa escalada de preços: o dólar alto e, principalmente, a crise de abastecimento de proteína animal na China.

A peste suína africana (PSA) é uma doença altamente contagiosa, causada por um vírus composto por DNA fita dupla, pertencente à família Asfarviridae. A doença não acomete o homem, sendo exclusiva de suídeos domésticos e asselvajados (javalis e cruzamentos com suínos domésticos).

Segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), “em setembro de 2018, o vírus da PSA foi detectado em suínos de subsistência na China e na Romênia e em javalis na Bélgica. Nestes surtos, a fonte comum de infecção foram restos de alimentos contendo produtos não cozidos, derivados de suínos, contaminados com o vírus”.

A Embrapa alerta que “a PSA é uma doença de notificação obrigatória aos órgãos oficiais nacionais e internacionais de controle de saúde animal, com potencial para rápida disseminação e com significativas consequências socioeconômicas, calculadas em cerca de 5,5 bilhões de dólares apenas no Brasil”.

No caso da China, a situação é gravíssima: cerca de 200 milhões de suínos deveriam ser abatidos ou morreriam em consequência do vírus. A carne de porco é a principal fonte de proteína animal dos chineses e não há país no mundo que tenha capacidade de produção para suprir as necessidades do país asiático.

Os maiores produtores de carne bovina no mundo são Estados Unidos, Brasil e Austrália. Eis o motivo do Brasil estar exportando tanta carne bovina para lá, desabastecendo o mercado interno e consequentemente aumentando os preços. E o problema té bem longe de terminar.

 

Segundo dados do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP, em outubro, as vendas de carne bovina para a China aumentaram 62% com relação ao mês anterior, totalizando mais de 65 mil toneladas. Por isso, o preço do boi gordo no Brasil segue batendo recordes.

Mas não só aqui: de outubro para novembro, o preço internacional da tonelada da carne bovina aumentou de US$ 4,47 mil para US$ 4,86 mil, bem do mesmo período em 2018, quando estava avaliada em US$ 3,9 mil.

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, ainda causou mais espanto ao afirmar esta semana que os preços mais altos não vão descer: “neste momento, o mercado está sinalizando que os preços da carne bovina, que estavam deprimidos, mudaram de patamar”, afirmou.

Dólar

Outro fator que impacta no preço da carne é o dólar alto. Com a moeda americana sendo negociada a bem mais do que R$ 4, os produtores enxergam mais vantagem em exportar do que abastecer o mercado interno. Na venda para fora, o exportador recebe em dólar e acaba se beneficiando na conversão para a moeda nacional.

O Cepea informa que o volume de carne exportado pelo Brasil se mantém acima das 100 mil toneladas desde julho de 2018, quando a China sentiu o baque da peste suína. Em novembro, a China autorizou 13 novos frigoríficos brasileiros a exportar para o país, no intuito de reforçar o abastecimento.

Com menos produto no mercado interno, os preços foram pressionados para cima. A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) afirma que em menos de três meses o custo do contrafilé subiu 50% para os supermercados; e o do coxão mole, 46%, por exemplo. Por isso, o aumento foi repassado aos consumidores, que sentem na conta essa situação.

E pode piorar: os preços atuais das prateleiras refletem as cotações antigas da carne no mercado internacional, o que sinaliza que podem subir.

O presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, explica o motivo: “o preço que está hoje ainda não espelha o mercado internacional, porque o exportador vende com antecedência. Quem vendeu no passado vendeu com os preços antigos. Quem está vendendo agora, sim, está usando os preços internacionais novos”, diz.

Impacto do preço da carne na inflação

Guilherme Moreira, coordenador da Fipe do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), diz que os preços da carne andavam contidos, e por isso não vê riscos de que a inflação aumente em 2020: “sozinha a carne não vai estourar a inflação, por mais que continue subindo ao longo do tempo. Todos os anos tem um choque desse tipo; batata, feijão”, pondera.

André Braz, coordenador do IPC e analista de inflação da FGV, prevê que a carne permaneça em patamares mais altos até pelo menos o primeiro trimestre do ano que vem, e vá perdendo fôlego ao longo do ano: “acredito que não vai terminar 2020 como a grande vilã da inflação”. O economista explica que as carnes (incluindo bovina, peixes, aves e suínos) representam um pequeno gasto no bolso do brasileiro, de cerca de 3% da renda familiar. “Fazendo uma comparação, pesa tanto quanto uma conta de luz”, diz.

 

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